quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Para Fujihara(1984)

Quando eu era pequena, era normal comprarmos uma latinha de refri e aproveitar o anel da latinha para descobrir quem seria o amor da nossa vida. Depois de ter bebido tudo (o que acontecia bem rápido) íamos entortando o anel e para cada lado entortado era uma letra: a, b, c, d...
Eu sempre achei esse esquema de descobrir o futuro muito bom, até porque lá por esse idade eu tinha umas quedas por um Diogo e por um Ian. Era só por um pouco mais de força no pobre anel que ele saía no D ou deixava rolar e saía I facilmente. O anel nunca passava do M, sempre quebrava antes, o maldito. Passei a infância toda apaixonada por um Rodrigo e ele nunca me deu bola graças a esse maldito anel do futuro.
Depois namorei, obviamente, um Daniel. E veio minha fase de negação do destino, da astrologia, de Deus (também com D) e, oclaro, do santo anel da latinha de refri.
Hoje, uma mulher madura e muito vivida, volto a usar a latinha de refri. Embora eu beba mais cerveja do que refri, eu não bebo muito cerveja em latinha e mais, quando estou bebendo cerveja, provavelmente tem alguém cuja inicial muito me interessa junto, e daí banco a cientista e ignoro o anel do futuro. Tenho completa convicção que o ignorando assim nunca serei um Tolkien ou um Wagner, mas parece-me que atualmente achar uma aliança perdida por aí e que caiba nesse meu dedo fino valeria mais a pena.
Claro, depois da negação do astrológico, veio a negação da pós-modernidade e estou recosturando todos os sutiãs queimados. Nessa fase machista e astrológica da minha vida, vou para academia e bebo coisas lights (a cerveja fica restringida a poucos dias na semana só para devolver meu bom humor). Há algumas semanas, estava bebendo pepsi light (porque ainda sou contra a coca nesse minha utopia infantil) e pensando como nunca vou poder ter amores da vida depois da letra M. Indo bem de levinho com o anel da sabedoria consigo chegar no M. O que descobri através de todos os Márcios e Marcelos que andaram passando na minha vida. Então meu instrutor da academia, Rafael, me disse para não beber refri nada. O que adianta ficar fazendo academia para perder peso e bebendo isso aí para ganhar celulite?
Mal sabe ele que eu não ligo para celulite e que tenho plena convicção de que homens que ligam para isso são gays ou nunca receberam um boquete decente e por isso ficaram olhando para os lados errados na hora certa. No meu mundinho reitoria-academia-boteco, gays são maioria, mas em geral eles não vêem minha bunda, então tudo bem.
Bom, depois do meu maldito instrutor com nome com R me falar para não tomar pepsi e ir tomar um del valle light, eu tive certeza de que ele é um porco capitalista. A Del Valle é da coca. Mas pensei que ice-tea é muito legal. E tem de pêssego ou limão [ou exclusivo, infelizmente =( ], tem light, vem com anel da sabedoria. Muito bom.
Lá fui eu, então, na semana passada comprar um ice-tea quando eu sabia que era o Rafael que estava cuidando da musculação.
Olha aqui meu chá. Ah muito bem, nem eu pensaria em uma opção melhor.
Internamente eu ri, né. Instrutores de academia gostam de falar obviedades.
Fui lá ficar erguendo pesinhos, olhando velhinhas e caras bombados que não me excitam e beber meu chá beeem rápido para ter mais um anel do destino a desvendar.
Eu jogo RPG, esse negócio de desvendar pode ser muito excitante.
Bebi, torci o anel... a, b, c, d, e....
Enquanto torcia o anel, pensava que o mundo é um negócio complicado. Uma vez você procura o amor da sua vida, depois seu marido, e só então busca o primeiro cara que vai beijar, para uma semana depois procurar o primeiro que vai transar. Logo, o próximo que vai transar. Em seguida, o segundo casamento. f, g, h, i.... Daqui a pouco procura um que consiga conversar sem ter um pirapaque e acha que já está bom. j, l, m, n.... Será que foi a pós-modernidade que imaculou a sagrada propriedade do anel ou fui eu que cresci como um pau que nasceu torto? o, p, q, r! Ops! R!
Veja que coisa! Instrutor maldito!
"Nem eu escolheria melhor!"
Idiota.
Se ele pensa que eu vou me casar com ele só porque estou bebendo um ice-tea,está enganadíssimo. Desci e comprei um guaraná antartica diet. L. Como sempre. Ufa. Ainda que eu não conheça agora ninguém com L que me interesse, me animei. Nunca se sabe quando alguém tem um Luís como segundo nome.
Saí da academia braba com a petulância do meu instrutor, me fazer indiretamente beber um negócio só para sair o nome dele. No entanto, um dia depois, na fila da cantina, me dei conta da grande sabedoria que eu adquirira. Se antes, com a pepsi, eu só conseguia nomes até o M e com certa dificuldade, agora com o Ice-Tea posso ir até o R. R é uma ótima letra, eu pensei.
No dia seguinte pensei em uma letra... algo pro fim da alfabeto... Não W, não V, não T. Letras que me dão ainda um certo pavorzinho. U, u é bom. Até porque tem tão pouco nome com U que se sair U vai ser mais fácil de achar o próximo piá. Ice-tea lata, ice-tea bebida, anel. U. Muito bom.
Testagem empírica. Pespi lata. Pepsi bebida. anel. G. Genial.
Ainda uma para ter certeza. Ice-tea lata. Ice-tea bebida. anel. S. Supimpa? Muito brega. S são sempre bregaS.
Corri pro banheiro. Tinha bebido muitos enlatados de uma só vez, mas enquanto mijava (o quanto uma mulher pode ser sexy falando mijava e não fazia xixi? Não sei!) percebi o quão dona do meu destino afetivo-sexual eu sou agora que tenho poder sobre o anel. Ainda que eu não desapareça quando eu o meta, escolho se meu próximo xixi vai ser de pepsi ou ice-tea.
Ainda que ter esse poder de escolha acabe um pouco com a minha utopia fetichista de ser só uma saia servindo de alvo por aí, é uma ótima forma de eu mesma me dar conta do que ando querendo. Decidir agora se vou pedir uma coca ou um ice-tea se tornou muito difícil e isso me lembra o quão conceitual eu posso ser. Faz dias que só bebo café.

Apêndice
E bebo café pensando que o A eu não vou atingir nunca.
Então termine a dissertação, enquanto eu bebo um ice-tea fugindo de todas as pepsis do mundo!

2 comentários:

  1. A minha sorte é que eu ainda não to fazendo a minha dissertação, porque estava esperando um texto sobre o Álvaro, mas a única coisa de Álvaro que tem nesse texto é a procrastinação que ele permite.
    Era isso? Interpretei direitinho?

    ResponderExcluir