sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Brincadeiras(?) irresponsáveis do PC Siqueira

Trecho do texto: O discurso irresponsável da esquerda inteligente: Sakamoto, Ferréz e PC Siqueira. O texto é uma reflexão sobre colocações machistas e irresponsáveis feitas pelo que chamo de "esquerda inteligente" em um encontro promovido pela Carta Capital terça feira, 4/2/14.

Por fim, quando o Sakamoto estava falando dos temas que eles ainda gostariam de tratar, citou a influência negativa da mídia, a questão étnica, negra, indígena, GLBT e foi lembrado, pela Karina Buhr, de enfiar as mulheres no saco a ser discutido. Algumas das mulheres da platéia ficaram felizes e uma disse "pauta de lavar louça".  Então, nosso querido amigo PC Siqueira responde: “ah lavar louça é muito chato”. Eu, então, que já estava muito #xatiaded, o chamei de machista e ele não gostou. Disse (e até tuitou depois) que se achar lavar louça chato é ser machista, ele é.

Bom, estamos numa mesa discutindo quais as questões sócio-políticas devem ser debatidas no próximo programa. A única mulher da mesa lembra pela segunda vez que “as mulheres existem”. Uma menina ingênua irresponsável da platéia liga a pausta feminista à cozinha. E a resposta do cara engraçadinho e mal preparado da roda é: lavar louça é muito chato. Eu me sinto uma idiota explicando porque esta afirmação neste momento é machista: é machista uma afirmação que liga a luta das mulheres à cozinha. Tanto a colocação da menina, que aparentemente só queria fazer mais uma piadinha, quanto a dele, que não podia perder a chance de continuar a zuera. Infelizmente, sendo piada ou não, as colocações resumem a luta das mulheres a lavar a louça! Uma afirmação sem desdobramento, apenas para ser engraçadinha (lembremos dos nossos queridos Gentili e Rafinha Bastos, eles não têm mesmo alguma cois“inha” que lembra o PC Siqueira?) e que em vez de apoiar a fala da Karina (“Sim! A luta das mulheres nos interessa!”) vem para rir dela, deslegitimar (“ah, não vamos falar de mulheres, lavar louça é muito chato”).

Eu vou partir do pressuposto que este moço (e, principalmente a moça da platéia) não quis dizer tudo o que pode ser interpretado desta frase. Digamos, ele é um carinha leviano que faz piada machista em rede nacional (já podemos chamar assim o #projetopiloto?). O mundo está cheio deles, não é? Tão cheio, mas tãããão cheio, que a gente nem liga mais, mas TEMOS que ligar. Especialmente quando é um formador de opinião libertário quem diz isto.

O que esta frase nos diz?
A luta das mulheres é chata.
A luta das mulheres não me interessa.
Eu não gosto de lavar louça, logo, não devo lutar pela causa feminista por que aí terei de lavar louça.

Quando o PC Siqueira fez esta linda afirmação, eu, do segundo andar, gritei “machista!”. A esta altura do campeonato, algumas pessoas já estavam gritando coisas e, seguindo a indicação do Ferréz (“que venha aqui um índio tumultar e nós discutimos a causa dele”), eu achei que era mesmo uma obrigação lembrar o moço e a platéia de que ligar o movimento feminista à cozinha não é bacana responsável. A menina da platéia respondeu algo que não ouvi, mas no vídeo vi que ela ironizou dizendo "feminazi", ou pra mim, ou para ela. Enfim, eu considero a intervenção desta menina só mais uma piadinha de um oprimido que ainda não entendeu que reforçar a piada não ajuda.

No fim do encontro, ele reiterou: “eu acho lavar louça chato, sou machista por isto?” e eu gritei de lá de cima “falar de lavar louça quando estamos discutindo feminismo é machismo”. Reduzir a luta feminista à decisão de quem vai lavar a louça é uma coisa inaceitável. Ele não me respondeu na hora e ainda levou o assunto para o tuíter.

 Bom, o fato de ele ter tuitado algo também me lembra a questão do “vamos falar mal de quem fala mal da gente”. A gente se une contra quem fala mal da gente. E mais, quem fala mal da gente são SEMPRE os haters e apenas isto. E quem falou mal do PC Siqueira? Uma feminista! E por que? Por que ele “apenas” falou que não gosta de lavar louça. Nossa! Que desserviço maior ao feminismo o PC Siqueira poderia ter feito? O inimigo comum agora é a mina que fala mal do pobre moço de nobre coração que não gosta de lavar louça (imagina, então, de recolher lenha!).


Depois de tudo que rolou lá, depois de reduzir as mina do rolezinho a simples objeto dos moleque revolucionário, depois de não dar voz à Karina, depois de reduzir a luta feminista à cozinha, ele tuita que “hoje uma mina me chamou de machista porque eu disse que lavar louça é um saco(?)”. Não, querido, não foi por isto, eu te expliquei na terça mesmo que não foi por isto e posso te explicar que todos têm o direito de achar chato, mas que ninguém tem o direito de reduzir a pauta feminista a isto. Eu gostaria de lembrar, já que estamos falando de louça, que não gostar é ok, mas não fazer e deixar tudo para sempre uma mulher fazer (sua esposa, mãe e até sua empregada!) é machismo. Isto é opressor e largar o serviço que você não quer fazer para uma mulher é sim uma forma de controle e de oprimir, de dizer “você vale menos, então faça o que eu não quero fazer”. Então, caros meninos lindos de esquerda, se você é libertário, lave a sua louça. Ébacana responsável.

Depois o PC voltou a postar “se não gostar de lavar louça é ser machista e estar errado, eu nunca quero estar certo”. A tuitada para definir o inimigo comum: as feministas loucas que acham que todos estão errados sempre e por qualquer motivo. Toda a esquerda tem este mesmo inimigo interno, a feminista. Então, o cara vai no tuíter reforçar qual estereótipo: o da feminista louca (louca, neurótica, maluca, barraqueira... todos estes adjetivos lindos que são próprios das feministas e mulheres no geral, né) que rotula as pessoas de machistas por nada. Não! Não poste isto, moço, nem sequer pense isto, por favor! Você não foi rotulado à toa, mas quem sabe isto sirva de ponto de partida de uma reflexão maior e não para que você continue desligitimando o movimento feminista. Talvez a maioria da esquerda seja ainda machista, então não ajude a reforçar estereótipos mentirosos que oprimem ainda mais uma classe que já é oprimida e que luta tanto quanto você por mudanças profundas na sociedade.

O que o PC Siqueira fez, ao vivo e também no tuíter, foi deslegitimar uma causa. The zuera never ends, não é mesmo? Desligitimar uma causa é você rir dela, zuar, tratar como banal. Você faz isto muitas vezes e também muitas outras pessoas fazem, logo esta causa vira motivo de piada, vira estereótipo. Este é um mecanismo de opressão usado desde sempre. Os opressores riem do negro, das mulheres, dos pobres. E o PC Siqueira riu de quem? Da mina que chamou ele de machista. Por que ele ri? Por que rir é a forma que ele escolheu para deslegitimar a minha afirmação. Quando ele faz piada da intervenção da Karina Buhr pedindo uma pauta feminista, ele usa exatamente o mesmo mecanismo opressor: ri, faz piada e ignora o que foi dito. “Vamos discutir machismo? Ah, eu não gosto de lavar louça.”

E se fosse o Ferréz falando que o movimento negro precisa também estar em pauta? A resposta equivalente seria “Acho ir para senzala muito chato” (por que, né, galera, a cozinha é a senzala da mulher e, como mostra o nosso querido PC Siqueira e a querida da platéia é a PRIMEIRA coisa que vem à mente quando o assunto é mulher ou feminismo). Poderia ser ainda “Ah, mas eu não gosto de cabelo pixain”. E aí? E aí que o Ferréz ia achar normal? Ia achar piada? Depois da primeira intervenção da noite trazendo a causa feminista à discussão, a resposta é “eu acho lavar louça muito chato”, é uma piada? Bonita, límpida, à la Chaves, que não significa nada? Que não oprime ninguém? Que não repercute? Que não evidencia o que este querido pensa da causa feminista e quais são as primeiras relações que vem à mente?

Bom, relembrando: eu gostei de ter participado do encontro. Eu não odeio nem o Ferréz, nem o PC Siqueira e, muito menos, o Sakamoto, mas (o famoso “mas”) nem sempre os discursos destes caras são coerentes e responsáveis. Nem sempre eles são capazes de aplicar um mesmo raciocínio a diferentes questões. Todos eles (inclusive o Sakamoto, mon amour) se referem às mulheres como objeto e, sendo estes três caras formadores de opinião DE ESQUERDA (esta é a nossa esquerda mais inteligente!), isto é preocupante. Tudo bem, eles são humanos, não sabem ainda de algumas coisas e a gente não sabe de outras. Então, a gente conversa e é só isto que este texto está tentando fazer.

Eu gostaria de pensar que o PC Siqueira não é machista, ele está machista. As pessoas são, sim, capazes de refletir e mudar de opinião e atitude. Logo, o moço tem agora a sua chance de repensar o seu próprio discurso, as suas piadinhas, as colocações que ele faz única e exclusivamente para ser engraçado, mas que ofedem um grupo muito grande de pessoas e que ajudam a perpetuar ainda mais as diferenças e privilégios entre grupos. Não seria bacana responsável com todas as pessoas que se identificam com o movimento feminista, ele repensar as suas questões e causasao invés de deslegitimar a minha fala?

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